Bruno Travassos nasceu em Coimbra, mas o lado académico trouxe-o até ao nosso distrito, por onde acabou por permanecer, tornando-se numa das principais figuras do Futsal Distrital e Nacional.

Com uma forte ligação à Universidade da Beira Interior (UBI), deu sempre prioridade aos estudos, conciliando a prática desportiva com a teoria e a investigação. É doutorado pela Faculdade de Motricidade Humana, em Futsal, sendo atualmente, entre outras coisas, Fisiologista da Seleção Nacional Futsal Masculino.

Tirou igualmente o Curso de Treinador, Nível I e II, tendo já orientado o GD Mata, Académica Coimbra, UD Cariense, Casa Benfica Penamacor, as Seleções Distritais da Associação de Futebol de Castelo Branco (AFCB) e a AD Fundão.

A AFCB esteve à conversa com Bruno Travassos, ficando a conhecer melhor a ligação ao Desporto desde novo, os passos dados no início da carreira e a forma como conciliou sempre a prática com a teoria, no Futsal e na vida.

AFCB: Como foi a infância? O gosto pelo Futsal apareceu cedo na tua vida?

BT: Foi uma infância normal, como todas as crianças. Gostava de praticar Desporto e jogar à bola, num contexto familiar em que o meu pai sempre esteve ligado a clubes desportivos – foi dirigente – e, como tal, passei muitas horas da minha infância em clubes de Futebol. Costumava ver jogos, assistir a treinos e, portanto, desde aí, fui criando um gosto muito grande pelo Desporto, em geral, e pelo Futebol, em particular.

O Futsal surge muito mais tarde, só quando venho estudar para a Universidade da Beira Interior (UBI). Até então, tinha praticado sempre Futebol e, com a vinda para a Covilhã, comecei a jogar Futsal com os amigos. O Futsal tem uma grande tradição na UBI – quer Futsal Universitário, mas também na prática informal, havia muitos torneios entre estudantes. Criámos uma equipa, começámos a participar nas competições e, entretanto, quis saber mais sobre a modalidade, porque não sabia muito. Na altura, não havia muita informação, mas lembro-me de um Seminário no Fundão, em que estiveram presentes alguns dos melhores treinadores nacionais. A partir daí, o bichinho foi crescendo, até que fiz o Curso de Treinador, mal me licenciei, e fui procurando saber sempre mais sobre a modalidade. Primeiro, para ser treinador e mais tarde, numa decisão que também considero importante, optar por um Mestrado em Futsal. Procurei direcionar todos os meus estudos para esta vertente.

AFCB: Falaste da ligação com o Futebol. Foste federado? E de Futsal?

BT: Sim, fui federado de Futebol desde os 13 anos até aos 20 anos. Já o Futsal, nunca joguei federado, só no contexto universitário. Infelizmente, não era o melhor jogador (risos). A vinda para a Universidade fez-me mudar de distrito, criou muitas alterações na minha vida pessoal e penso que esse é o momento determinante para a prática ou abandono do Desporto nos jovens. Ainda hoje, criamos muito poucas condições para se continuar a praticar Desporto. E foi um problema na altura. Não conhecia muito dos clubes da Covilhã, ainda estive um ano a estudar cá e a jogar no clube da minha terra – Clube Desportivo Carapinheirense - mas a ligação e a possibilidade de conciliar as duas coisas foi-se perdendo.

AFCB: Já referiste que os estudos te trouxeram até ao nosso distrito, mas posteriormente, qual a razão para teres permanecido?

BT: É uma história interessante. Vim para a Covilhã estudar, tirar a Licenciatura em Ciências do Desporto, e quando terminei já estava a treinar a equipa de Iniciados do GD Mata. No final da época, surgiu a oportunidade de realizar um estágio na Câmara Municipal de Montemor-o-Velho, na área da Gestão do Desporto, que também tinha interesse, e estava dividido entre o treino e a gestão. Em abril, quando finalizou o Campeonato, fui para Montemor e iniciei o meu estágio profissional. Nessa altura, também já estava a realizar o Mestrado na UBI, em Ciências do Desporto, e surgiram-me duas possibilidades: continuar na Câmara Municipal de Montemor-o-Velho e permanecer na minha terra ou candidatar-me a uma vaga de Professor na UBI e voltar para a Covilhã. Candidatei-me, fiquei com as duas possibilidades em aberto, e acabei por ficar na UBI, porque considerei o desafio de voltar ao Interior e sair da minha zona de conforto como uma oportunidade para fazer coisas diferentes e continuar a evoluir na investigação do Futsal e do treino desportivo. Foi, por essas razões, que voltei para a UBI novamente.

AFCB: És um dos principais rostos do Futsal no distrito. Tens Licenciatura, Mestrado, Doutoramento e estás à frente da pós-graduação no treino em Futsal…. É um currículo extenso. Fala-nos um pouco do teu percurso académico.

BT: Tenho a Licenciatura em Desporto na UBI, fiz o Mestrado também em Desporto, em que procurei que a minha dissertação fosse já no âmbito do Futsal. Após esta etapa, tirei o Curso Treinador, Grau I e II - era algo que queria muito fazer e estar ligado à prática. Entretanto, fui fazer o Doutoramento à Faculdade de Motricidade Humana, em Lisboa, também na área do Futsal, análise do jogo e compreensão da tomada de decisão do jogador no Futsal. Penso que foi um marco importante, porque abriu-me outras perspetivas sobre o treino e a investigação. Foi, neste contexto, que acabei por conhecer o mister Jorge Brás, quando fui recolher dados para a investigação. A partir daí, continuei sempre ligado à modalidade. O meu foco, após o Doutoramento, foi a investigação, mas ao mesmo tempo, era também treinador. Na altura estava na Casa Benfica Penamacor e como adjunto na AD Fundão e nas Seleções Distritais. A minha grande preocupação era que a minha investigação ajudasse em alguns dos problemas que íamos sentindo. Ou seja, trazer alguns problemas da prática para a investigação e levar alguns conteúdos para a formação dos treinadores.

AFCB: Consideras que essa ligação, entre o teórico e o prático, é fundamental para resolver os problemas da modalidade?

BT: Sempre houve esta discussão. Se a intervenção é mais científica ou mais prática, se os treinadores devem vir das Universidades ou da prática como por exemplo da vivência de ex-jogadores… Sempre houve uma discussão muito grande. O que considero cada vez mais é que nem é uma coisa, nem é outra. Precisamos de todos, porque vão sempre aportar alguma coisa. O que acredito é que, sem conhecimento, não existe evolução. E esse conhecimento pode surgir de diferentes partes. Pode advir de pessoas que tiveram muita experiência no passado e que vão contribuir, de forma determinante, para que os outros aprendam, mas também pela investigação, que vai trazendo novas ideias e aportando novas formas e abordagens, que ajudam bastante a intervenção. Penso que é desta relação que vamos evoluindo. Disse-o há pouco tempo e reforço: o desenvolvimento do Futsal em Portugal foi possível da forma que foi, porque conseguiu conciliar muito bem estas áreas – Universidade, Federação e Associações Distritais e Associação Nacional Treinadores.

AFCB: Começas o teu percurso como treinador de Futsal, em 2003/04, na equipa de Iniciados do GD Mata / AAUBI. Como surgiu esta oportunidade e o que te fez aceitar?

BT: A oportunidade veio, mais uma vez, dos amigos. Um dos principais responsáveis por hoje estar no Futsal é o Sérgio Figueiredo, atual Selecionador Nacional de esqui alpino. Na altura, ele tinha o Curso de Treinador, foi convidado para assumir o GD Mata e desafiou-me para ser treinador com ele, porque muitas vezes não estava cá no inverno devido ao esqui. Então começamos a treinar juntos e por isso o inicio da minha atividade de treinador de Futsal deve-se muito ao Sérgio Figueiredo, porque sem ele não tinha tido aquele empurrão. Foi assim que iniciei e começou muito bem, com um conjunto de jogadores que, atualmente, ainda temos contacto e vamos falando. Foi uma experiência fantástica.

AFCB: Na época seguinte assumes a equipa de futsal da Académica e, em 2005/06, regressas ao GD Mata para orientar a equipa de Juniores. Como foram essas duas experiências?

BT: Sim, está relacionado com a história que contei. Fui fazer o estágio profissional a Montemor-o-Velho, onde também trabalhava o treinador da Académica, Francisco Batista, e estavam a precisar de um treinador para a equipa B. Então fui como adjunto da equipa A e acompanhava a equipa B, que disputava o Distrital de Coimbra. Em 2005, não acabo a época na Académica, porque sou colocado na UBI e, na temporada seguinte, volto para a GD Mata.

AFCB: Em 2006/07, tens a oportunidade de comandar a equipa feminina do Estrela do Zêzere. Como apareceu essa oportunidade? Havia uma grande diferença, na altura, entre o futsal masculino e feminino?

BT: Foi uma experiência muito interessante, muito positiva e com grandes aprendizagens. Era uma equipa de grande nível, que tinha disputado as Taças Nacionais e tinha grandes aspirações para chegar o mais longe possível. Fui convidado pelo Presidente do Estrela do Zêzere na altura, Sr. António Manuel, e foi um ano muito positivo. Foi uma época de reformulação, tinham saído duas ou três jogadoras e tivemos algumas dificuldades, porque foi uma altura com muitas mudanças e alguma instabilidade. Até conseguimos, ainda assim, alguns resultados interessantes e acabámos por ser eliminados nas meias-finais, num jogo muito bem disputado e em que não tínhamos guarda-redes.

Essa equipa tinha muito potencial e, na comparação Masculino-Feminino, estava muito à frente do nível de desenvolvimento do Feminino em Portugal. Já estava junta há muitos anos e tinha sido trabalhada desde os tempos em que o José Luís Mendes foi treinador do Estrela do Zêzere. Apesar de considerar ter sido uma temporada positiva, acaba por ser o último ano da equipa feminina no Estrela do Zêzere, por problemas que ultrapassam o Futsal.

AFCB: Nas temporadas seguintes tens as primeiras conquistas a nível sénior. Após uma época na UD Cariense, assumes a Casa Benfica Penamacor e conquistas o Campeonato e Taça Distritais. Foi um ano de sucesso…

BT: No Estrela do Zêzere, conquistámos tudo – Campeonato, Taça e Supertaça AFCB – e na Casa Benfica Penamacor aconteceu exatamente o mesmo. Com a UD Cariense não ganhámos nada, uma vez que era uma equipa em crescimento e foi mais uma parceria com o Sérgio Figueiredo, em que treinámos os dois e acabei por ficar mais responsável. Em Penamacor, o clube tinha descido para o Distrital e fizeram-me o convite para iniciar o projeto, sendo que o desafio era subir logo na primeira temporada. Era uma época difícil, porque estava o Penamacor e o Ladoeiro no Distrital e tinha também surgido o Sporting Covilhã. Eram três equipas muito fortes a disputar a subida ao Nacional, mas foi um Campeonato muito bem disputado e interessante, em que aprendemos muito sobre a gestão do plantel e lidar com objetivos claros de subida.

AFCB: Como foi a temporada seguinte na III Divisão?

BT: Considero que foi positiva. Ficou apenas um amargo de boca quando, na parte final, perdemos um ou dois jogos e ficámos muito perto dos lugares de subida à II Divisão. Em dois anos, vamos praticamente do Distrital à II Divisão. Creio que ficámos a três pontos da subida, mas posteriormente, acabam por surgir problemas na Casa Benfica Penamacor e o clube nem entra na III Divisão. Ou seja, havia expectativa de subir de Divisão, mas nem continuaram no terceiro escalão. Houve problemas financeiros, a equipa já tinha um orçamento considerável face à realidade e considero que o trabalho foi bem feito e tínhamos condições para consolidar o clube na III Divisão, mas infelizmente isso não aconteceu.