João António Barroca de Brito é o convidado do mês de novembro da rúbrica “No Interior do Jogo”. Nascido a 10 de fevereiro de 1958, esteve envolvido na fundação do Clube Académico do Fundão, onde foi jogador e dirigente durante várias décadas.
Representou também a Associação Desportiva do Fundão e foi federado de diversas modalidades – Futebol, Basquetebol, Andebol e Xadrez.
Além do Desporto, mantêm uma grande paixão pelo colecionismo. Foi responsável pela edição das revistas dos 19, 20, 22 e 30 anos do CA Fundão e, em 2018, em co-autoria com o filho Bruno Brito, editou o livro "Desporto no Fundão". Em termos expositivos fez mais de 75 mostras, sempre graciosamente, abrangendo os mais variados temas do colecionismo, assim como na parte documental ligados às memórias. Em 2005, na sessão solene do Aniversário do Concelho do Fundão, foi distinguido com a Medalha de Prata de Bons Serviços da Câmara Municipal do Fundão.
Na primeira parte da conversa com a AFCB, João Brito fala da infância, da fundação do CA Fundão e da carreira no Futebol e Futsal.
AFCB: É natural do Fundão? Como foi a infância e como surgiu a ligação ao Desporto e ao Futebol?
JB: Na infância, antes do 25 de Abril, havia muita juventude. Os meus pais tinham uma taberna numa das ruas mais conhecidas do Fundão e havia muita juventude naquela rua. A partir dos cinco-seis anos de idade, era uma animação até às 21 horas.
AFCB: Como é que surgiu a ligação ao Desporto e ao Futebol?
JB: Quando estava na Escola Primária, todos jogavam à bola e eu também jogava, curiosamente sempre a guarda-redes. Chegava todo esfolado a casa e a minha mãe ficava fula. Nessa altura, havia um estabelecimento que vendia os cromos dos jogadores, que vinha embrulhado nos rebuçados, e comecei aí o colecionismo. Havia o Sporting Covilhã, o Olhanense, o Casa Pia, o Sintrense … então todo o dinheiro que recebia, na altura estamos a falar de tostões, comprava os rebuçados e guardava os cromos. Quando vinha o Natal, eu e a minha irmã fazíamos o presépio na taberna e as pessoas iam deixando lá uns tostões. Então, aproveitava esse dinheiro todo para gastar nos cromos dos jogadores. Na altura, as cadernetas ficavam sempre incompletas – faltava sempre o jogador da lata, que só os comerciantes é que tinham e davam a quem queriam. Quando tinha sete anos, consegui completar a caderneta, porque me deram esse cromo, que curiosamente era o emblema do Sporting Covilhã. Foi uma festa. Nós não ficávamos com a caderneta, tínhamos de devolver e recebíamos uma bola de cor, com o pipo por dentro. Foi uma maravilha, mas só esteve dois ou três dias na minha mão, porque quando fui jogar futebol com os miúdos da rua, a bola foi para a horta e o dono ficou logo com ela. No final do dia, foi à minha taberna e disse ao meu pai que eu e os meus amigos dávamos-lhe cabo da horta. O meu pai pegou na bola e, com uma faca, esvaziou-a toda. O que chorei, tinha oito anos. Foi uma deceção.
Mais tarde, deixei de colecionar coisas relacionadas com futebol e comecei a focar-me nos selos de Portugal. Tenho a coleção completa, desde D. Maria até hoje. Tudo o que ganhava, investia nos selos.
AFCB: É um dos fundadores do Clube Académico do Fundão, em 1974. Qual foi o objetivo de criar um clube?
JB: Havia pessoas mais velhas e nós, os mais jovens, acompanhámos. Havia divergências, a muitos níveis, com a Associação Desportiva do Fundão, que não tinha futebol. Aliás, na época, até diziam que o Fundão não gostava de futebol. Desde o início dos anos 20, o Fundão andava sempre com o campo às costas, mas quando a Desportiva foi fundada, participou logo nesse Distrital. Como os resultados não foram os desejados, nunca mais quiseram participar. Em 1971, construíram o atual campo, mas até então, andava sempre com o campo às costas.
É assim que surge o Clube Académico do Fundão, por divergências com a Desportiva, principalmente relacionadas com o futebol. Nos torneios populares nas aldeias, o Académico já participava, ainda antes da fundação oficial. A Desportiva era quase um clube de elite e a fundação do Académico também resulta de querermos pegar em desportos mais populares e acessíveis.

AFCB: Quais eram os Desportos existentes no Académico, à data da sua fundação?
JB: Na altura da fundação, foi criada a Direção Geral dos Desportos e começaram a incrementar nas escolas, além do Futebol, o Basquetebol, o Atletismo … houve um dos fundadores, Francisco Tavares, o Chico Zé, que deu um impulso muito grande na prática desportiva. Ele e o professor Herminio Branco eram das pessoas que mais movimentaram o Desporto no Fundão. Se lhe disser que fui federado em Andebol, Basquetebol, Voleibol, Xadrez e Futebol, demonstra o leque de modalidades que uma pessoa podia praticar. Tivemos jogos de Basquetebol, no escalão de Iniciados, ligados às escolas, que fazíamos com a Covilhã e Castelo Branco. Foi nesta altura que nasceu o Pavilhão da Inatel, na Covilhã, e ainda existia o Pavilhão da FAEC e dos Penedos Altos.
AFCB: Que idade tinha quando esteve envolvido na fundação do CA Fundão? E também foi jogador do clube… Em que posição jogava e como foi a carreira de jogador?
JB: Tinha 16-17 anos. Jogava a guarda-redes e o meu filho Bruno, curiosamente, acabou por me seguir as pisadas. Tive uma carreira com altos e baixos, com muita vivência, e joguei até aos 46 anos. Na parte final, já mais no Futsal. Aliás, ganhámos muitos torneios no Fundão e em Alcains. Havia a disputa direta com Castelo Branco, que eram os craques que andavam na II Divisão, mas perderam connosco (risos).
AFCB: Teve uma história curiosa na sua estreia como guarda-redes…
JB: Sim. O guarda-redes era mais velho e, num jogo amigável, em Fornos de Algodres, lesionou-se. O Chico Zé não tinha mais ninguém para levar a um jogo em Penamacor, além do miúdo que jogava Futsal, que tinha 16 anos. Conclusão: estava habituado a jogar numa baliza mais pequena e, as duas primeiras bolas que lá foram, deram golo. Meti na cabeça que não podia ser assim e, juntamente com os meus colegas, ainda demos a volta ao resultado na primeira parte e, a partir dali, comecei a engatar. Defendi ainda dois penáltis, um deles no último minuto do jogo. Isto é para guardar na memória, ainda tenho a crónica desse jogo em casa.
AFCB: Mais tarde, foi também dirigente do CA Fundão. A área do dirigismo interessava-lhe ou foi pelo amor ao clube?
JB: Foi mais por amor ao clube que, na altura, atravessava uma situação complicada. Tenho de realçar que, se o Académico existe, devem-no a duas pessoas: Jorge Estevão e Luís Oliveira. Não vou falar nada contra ninguém, mas o atual Presidente foi das pessoas que abandonou o barco no final dos anos 80. Joguei na Desportiva e no Académico e a transição para Diretor foi imediata. Tenho de fazer esta homenagem aos dois, porque se não seguram o clube naquela altura … e mesmo assim conseguiram ser Campeões Distritais, levar a equipa ao Nacional e alcançar um 8º lugar em Iniciados, a melhor classificação do clube.
AFCB: Quantos anos esteve como dirigente? Quais os principais feitos e memórias do clube nesse período?
JB: Desde 1991 até 2017, cerca de 26 anos. O clube, na altura, teve muitos jogadores que foram Campeões Distritais, que foram aos Campeonatos Nacionais e fizeram grandes participações. Tínhamos atletas nas Seleções Distritais e alguns transitaram para o SL Benfica, Sporting CP e Boavista FC. Alguns ainda conseguiram lá chegar, mas faltava alguma coisa, principalmente em termos mentais.
Fui várias vezes Vice-Presidente e Vogal. Nunca fui Tesoureiro, porque não quis. Nunca quis grandes cargos, preferi sempre ficar nos bastidores e não dar muito nas vistas.