Joaquim Vieira, conhecido apenas como Vieira no mundo do Futebol, nasceu na zona de Lisboa, mas foi no distrito de Castelo Branco que passou mais anos na carreira e que fez vida após pendurar as chuteiras.
Fez treinos de captação no SL Benfica, mas foi no Sporting CP que realizou a formação. Representou o Atlético CP e o Amora na I Divisão e conta com diversas subidas de divisão no currículo.
No nosso distrito atuou no Benfica e Castelo Branco, no CD Alcains, na ADC Proença-a-Nova, no Salgueiro do Campo e no Pedrógão São Pedro. Pendurou as chuteiras com 42 anos.
Na segunda parte da conversa com a AFCB, Vieira fala das diversas experiências no distrito, a carreira de treinador e da nova modalidade que pratica atualmente – o Walking Football.
AFCB: Voltas, em 1987/88, para Castelo Branco e para o SBCB, onde passas mais três temporadas. O que te fez voltar?
JV: Como já estava casado e a minha mulher tinha família em Castelo Branco, decidimos voltar. Os laços familiares, o amor pelo Benfica e Castelo Branco e pela cidade – que me acolheu muito bem – pesaram na decisão de regressar. E não tenho vergonha nenhuma de dizer que hoje tenho a vida estabilizada graças ao clube. Foi o Benfica e Castelo Branco, por intermédio de Diretores, que consegui um emprego na Câmara Municipal de Castelo Branco. Atualmente estou aposentado, tenho uma família espetacular, uma vida estabilizada e posso agradecer ao clube e à cidade.
AFCB: Em termos desportivos, como foi a segunda passagem?
JV: Foram maravilhosas. Quando regressei o Benfica Castelo Branco estava III Divisão, subimos à II Divisão com o Miguel Quaresma, como treinador, e com o Jorge Jesus, como jogador. Na época seguinte, com o Félix Mourinho como timoneiro, subimos à II Liga. Foram dois anos com subidas consecutivas. Tenho um orgulho muito grande em ter no currículo várias subidas e ser Campeão Nacional de Futebol.
AFCB: Em 1990/91, sais do SBCB e, nas épocas seguintes, passas pelo CD Alcains e ADC Proença-a-Nova, na III Divisão, e CU Idanhense, Salgueiro do Campo e Pedrógão São Pedro, onde em 1998/99, terminas a carreira de jogador. Como foram essas experiências? Penduraste as botas com que idade?
JV: Sai do Benfica e Castelo Branco com 35 anos e, nessa equipa que subiu à Liga de Honra, treinávamos de manhã e de tarde. Como já estava a trabalhar, tinha dificuldade em conciliar tudo.
Joguei no Distrital até aos 42 anos. Tirei o nível I e II de treinador e as experiências na fase final da carreira foram agradáveis e totalmente diferentes. As coisas nem sempre correm como queremos, mas fiz boas temporadas. A minha primeira época no Salgueiro do Campo era só jogador, mas nas três temporadas seguintes, estive lá como treinador-jogador. Nesse período alcançámos um 2º lugar, em que conseguimos ir à Taça de Portugal. A última época já era praticamente só treinador. É difícil, porque nem estamos a jogar, nem estamos a treinar. No banco temos mais vantagem e lemos o jogo de maneira diferente que no campo.
AFCB: Quando terminaste a carreira de jogador, aos 42 anos, foi difícil?
JV: Custa sempre. Pendurei as botas em termos de Futebol profissional no ADC Proença-a-Nova e, após as experiências como treinador-jogador no Distrital, abracei uns anos bons nas camadas jovens do Benfica e Castelo Branco. E também orientei os Juniores da AD Penamacorense.
AFCB: São muitos anos de futebol e com vivências com várias figuras, como Diamantino Miranda, Augusto Inácio, Jorge Jesus, entre muitos outros. Há alguma história mais engraçada que nos possas contar?
JV: Posso contar algumas. Quando houve a transição do Amora para a I Divisão, os balneários estavam em obras e era onde estavam os banhos de imersão. O clube improvisou e arranjou uns bidons, que eram utilizados para transportar óleo, cortou e os jogadores faziam os banhos naqueles bidons. Tenho fotografias minhas e do Narciso, dentro dos bidons. Isto é a realidade.
Outra história foi também no Amora. O campo é à beira-mar e, na pré-época, estava um calor tremendo e o campo ficava cheio de melgas. O roupeiro acendia fazia uma fogueira para, com o fumo, as melgas irem embora.
Também me recordo de, no final de um treino, com um nevoeiro imenso, subir a uma baliza e ficar lá escondido. Ninguém sabia de mim, andavam todos à minha procura e eu, no cimo da baliza, escondido. Isto são algumas histórias, mas o Futebol deu-me muito boas recordações.
AFCB: Segue-se um percurso como treinador. Sentiste muita diferença para os tempos de jogador?
JV: As diferenças são notórias. Quando somos treinadores, o relacionamento e o respeito com os atletas são muito importantes. Nos Seniores, há sempre mais algum cuidado, mas sempre tive boas relações.
Penso que fiz um excelente trabalho, na altura, nas camadas jovens. Estive três épocas com uma equipa de Iniciados, sempre nos Campeonatos Nacionais, em que os Quadros Competitivos eram muito diferentes dos atuais. Apanhávamos equipas como o SL Benfica, Sporting CP, Estrela da Amadora, U. Leiria, Marinhense, e só havia uma Divisão. Consegui manter essa equipa de Iniciados, em três anos consecutivos, no Campeonato Nacional. O Benfica e Castelo Branco ficava sempre em 3º ou 4º lugar. Passei, mais tarde, para os Juvenis, com os mesmos miúdos e fomos Campeões Distritais sem derrotas. Só empatei um jogo. Dessa equipa, na temporada em que o Benfica e Castelo Branco subiu da III à II Divisão, quase só com jogadores da cidade, jogava o Tomás Sousa, Chiquinho, Tiago Paulo, Eskivas, o Quim Marques - foram vários os que subiram à equipa principal.
Após sermos Campeões Distritais, continuei no Nacional de Juvenis e voltámos a apanhar os tubarões todos. Na altura, os melhores jogadores do distrito iam jogar nas equipas que estavam no Nacional. E, já que estamos a falar de Formação, sem querer beliscar ninguém, quantos jogadores temos do distrito nas competições profissionais? Só o João Afonso e o Kikas. Alguma coisa está mal no nosso distrito.
Sinto que falta qualquer coisa na nossa Formação. Antigamente, no Benfica e Castelo Branco, os jovens, que jogaram na II e III Divisão, levantavam-se às 07 da manhã, estavam na escola ás 08 horas e, às 19:00, iam para o Juncal, para o Salgueiro ou para a Lardosa, treinar em campos pelados, à chuva e ao frio, e no dia seguinte, estavam novamente na escola. Eram outros tempos e não havia as condições de agora. Acredito que os rapazes, de há 10 ou 15 anos atrás, se aparecessem agora, com estas condições, iam dar todos jogadores profissionais.
AFCB: Ainda colocas a hipótese de voltar a treinar?
JV: Não. O Futebol está na minha alma, joguei nos veteranos até aos 64 anos e só deixei porque tive um problema na vista. Atualmente, pratico Walking Football e sou treinador dos veteranos. Neste momento, estou de corpo e alma nos veteranos e continuo ligado ao Futebol, que é o que adoro.
AFCB: Para quem não te viu jogar, que tipo de jogador eras?
JV: Era um jogador rápido e fisicamente muito forte. No Sporting CP, era ponta de lança e fiz muitos golos, sendo o melhor marcador em muito torneios. Tinha uma boa elevação e um remate forte. Era esquerdino e fazia muitos golos de livre. Com a idade, fui passando para médio esquerdo, até que acabei na ADC Proença-a-Nova, na III Divisão, como lateral esquerdo. Costumava dizer que, onde metia os olhos, metia a bola. Até dizia para os meus colegas e, mais tarde, jogadores, esta leva chofer.
AFCB: Atualmente, praticas Walking Football, uma nova modalidade da FPF. É importante para os antigos jogador – e não só – se manterem ativos?
JV: É uma modalidade recente e ainda bem que apareceu, devido ao sedentarismo das pessoas mais velhas. A Universidade Sénior de Castelo Branco vai a muitos torneios. O mais importante não é vencer, mas sim o convívio. Ainda assim, como somos homens do Futebol, há sempre competição e, se conseguirmos juntar o útil ao agradável, queremos sempre ganhar. E, na última época, fomos Campeões Nacionais Walking Football.
Temos mais provas no futuro e todos os meses temos um torneio. É muito importante para combater o sedentarismo e a solidão. As pessoas vão conviver umas com as outras e é de salutar. Quem tiver a oportunidade, que experimente.
AFCB: Na tua opinião, que características – físicas e mentais -, deve ter um jovem atualmente para singrar no futebol?
JV: Quando fui jogador, era um bocado rebelde e irreverente. Os jovens, atualmente, devem ter uma vida mais regerada, que se dediquem de corpo e alma, sem descurar os estudos e o lado humano. Nem todos podem ser Mardonas e Ronaldos e, por vezes, há a ilusão dos empresários e fica-se sem Futebol e sem estudos.
É um alerta que faço. Tenham os pés bem assentes no chão, pensem com a cabeça, porque não é fácil ser jogador profissional. É preciso ter gosto, privar de muita coisa, temos de ser humildes e trabalhar muito.
AFCB: Que mensagem gostavas de deixar aos jovens do distrito que querem seguir o mundo do futebol – seja como jogador ou treinador?
JV: Foi o que já referi anteriormente. Só peço aos jovens para terem a cabeça no lugar, porque o Futebol não é fácil e não é para todos. Se tivermos de ser médicos ou engenheiros, somos. O Futebol é para quem pode e para quem quer. Não é para curiosos. É uma profissão de desgaste rápido e peço aos jovens para terem juízo, foco e sacrifício. É a mensagem que deixo.