O gosto pelo futebol e pelo futsal começou muito cedo, por influência do pai, e da prática na Escola para a inscrição num clube, foi um pequeno passo. O gosto por Desporto e o bicho da competição levaram-na a federar-se em Futsal.
Iniciou o percurso na Casa Benfica de Belmonte, com o irmão mais velho, passando posteriormente para a União Desportiva Cariense. A partir daqui não parou mais e, neste momento, é jogadora da equipa feminina do Sport Lisboa e Benfica.
Adriana Mendes, Dricas no mundo do futsal, é a primeira convidada da nova rúbrica da Associação de Futebol de Castelo Branco: “No Interior do Jogo”.
Natural de Caria, a futsalista, de 25 anos, já venceu todos os troféus a nível nacional e, recentemente, contribuiu para a primeira conquista internacional do clube encarnado. Licenciada em Solicitadoria, a dia-a-dia não é fácil e é necessário fazer alguns sacrifícios para conciliar as duas paixões.
A AFCB esteve à conversa com Adriana Mendes e ficou a conhecer melhor o seu percurso e os obstáculos que teve de ultrapassar para vingar no futsal nacional.
AFCB: Como nasceu o gosto pelo Futsal?
AM: Desde muito cedo que acompanhei o meu pai a ver os jogos de futebol do Benfica. Sou benfiquista desde que me lembro e víamos jogos em casa, no café, no estádio e penso que foi isso tudo que fez crescer a paixão pelo Desporto e pelo Benfica.
Só depois disso é que, na Escola, gostava de jogar com os meus colegas e, a partir daí, não parei mais. Da Escola passou para o Desporto Escolar e, mais tarde, decidi federar-me, porque queria mesmo jogar e, acima de tudo, queria competir.
AFCB: Fazes a maior parte da formação no UD Cariense. Como surgiu essa vontade?
AM: No início, ainda com o meu irmão, comecei na Casa Benfica Belmonte – foi a minha primeira experiência. Só que jogava com rapazes muito mais velhos que eu, era uma equipa de juvenis masculino – com 15 e 16 anos – e eu tinha 10, 11 anos. Não foi para competir, foi simplesmente para treinar, porque só havia equipa feminina nos seniores e tinha de me inserir para experimentar.
Como ali não dava para competir, descobri que, em Caria, iam abrir as Escolinhas de Futsal de Formação. Era onde morava e onde estudava e foi muito mais fácil a adaptação. Comecei a formação na UD Cariense, com 13 anos, e fiz até final.
AFCB: A maior parte das equipas do distrito não tem escalões femininos. Sentiste que isso foi um obstáculo para ti?
AM: Nesse aspeto acho que tive alguma sorte, porque os meus colegas no clube eram os mesmos da escola primária e ciclo, portanto foi muito mais fácil a adaptação. Não estava com pessoas estranhas, não estava com rapazes que não conhecia, pelo contrário, e os treinos era onde aprendíamos, de forma mais séria, as bases do futsal.
AFCB: O futsal feminino, no geral, e nesta zona do país, é mais difícil singrar. Concordas? Sentiste maior dificuldade por seres do interior?
AM: O caminho pode ser um bocadinho mais longo. Não consigo dizer que seja totalmente igual, mas se calhar é a 90%. Temos muitos torneios, muitos interassociações, muitas atividades da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) – que promovem o encontro entre atletas de todo o país e que nos coloca numa posição de igualdade. A nível competitivo, estamos um pouco mais escondidos, mas isso está relacionado com as competições em que nos inserimos ou a falta delas, nomeadamente no feminino. Obviamente que, se aqui não tenho uma Prova Nacional para competir, não posso dizer que a visibilidade seja a mesma que num Campeonato Nacional.
De qualquer forma, a FPF já promove vários eventos que nos permitem igualar, um pouco, as atletas por todo o país. Não posso dizer que senti tantas dificuldades, porque todos os anos tínhamos Torneios Interassociações, seja futebol ou futsal e de vários escalões. Tive oportunidade, durante a formação, de participar praticamente todos os anos e, por aí, não me posso mesmo queixar de falta de oportunidades. Claro que isso também se conjuga com a experiência nos clubes, como as Taças de Portugal.
As oportunidades vão surgindo, depois temos de ir traçando o nosso caminho e tomar opções. Mas sim, existem oportunidades.
AFCB: Abordaste os Torneios Interassociações (TIA), um pouco o trabalho que as Associações de Futebol desenvolvem com a FPF. Achas importante esse trabalho para as jogadoras destacarem-se a nível nacional?
AM: Importantíssimo, sem dúvida. Os TIA são uma porta aberta para o patamar nacional, seja seleções ou outros clubes. Há muita gente atenta e, sem dúvida, que é uma grande oportunidade. Além da experiência, enquanto atletas, pelo nível competitivo, é uma porta aberta a nível coletivo e do sucesso desportivo para clubes e seleções nacionais.

AFCB: Ainda com idade de júnior, tens a primeira experiência fora do distrito, no Restauradores Avintenses, do Porto. Como aconteceu esse passo? Foi difícil sair da zona de conforto?
AM: Olhando para o meu percurso, em que fiz a minha formação com rapazes na UD Cariense, a oportunidade surge no último ano de formação. E quero agradecer ao clube, porque na altura promoveu muito o Futsal Feminino, tendo criado mesmo uma equipa sénior e de juniores.
Perante o cenário competitivo que vivi, percebi que, com aquela idade, estava a precisar de algo mais e de ter mais competição. Queria levar mais a sério – com essa idade sim, já tenho esse bicho – e experimentar algo mais profissional e foi aí que decidi mudar-me para o Porto, juntamente com o término do Secundário. Entrei numa Universidade do Porto também e fui para um clube que estava na 1ª Divisão do Campeonato Nacional. Tive uma experiência com um treinador fantástico – André Teixeira, que está na Seleção Nacional -, em que aprendi mesmo muito e deu-me asas e uma visão totalmente diferente do que era o futsal feminino e a experiência competitiva.
AFCB: Conseguiste conciliar os estudos com o Futsal?
AM: Sim, nesse aspeto nunca senti grandes dificuldades. Era uma gestão de tempo. É mais difícil hoje, a trabalhar, do que antes a estudar. Se calhar abdiquei de algumas coisas na minha vida académica, porque precisava de descansar ou não tinha tempo. Mas, ainda assim, nessa altura só treinávamos três vezes por semana, por isso até tinha bastante tempo para mim e para estudar. Não era um problema.
AFCB: A verdade é que não voltaste ao distrito e dás o salto para o Quinta dos Lombos. Como foi chegar a uma equipa da I Divisão? Quais as principais dificuldades que sentiste?
AM: Quando me mudo para Lisboa e para o Quinta dos Lombos, não conhecia ninguém. O meu maior impacto foi chegar e “ok, eu estou aqui, já me mudei, isto é real, agora tenho de me adaptar e conhecer as pessoas”. Temos sempre o receio de não correr bem ou não nos sentirmos bem, mas nesse aspeto, os quatro anos no clube foram fantásticos. Todas as pessoas com quem vivi lá, ainda as trago hoje comigo e facilitaram muito a minha adaptação.
A nível de futsal, fui muito feliz. Começámos com um projeto pequeno – o Quinta dos Lombos tinha perdido muitas jogadoras para o Sporting CP e SL Benfica – e unimo-nos e conseguimos conquistar algumas coisas. No terceiro ano, atingimos um 2º lugar no Campeonato Nacional – algo inédito – e fui mesmo muito feliz.
AFCB: Pensaste que a mudança para o Quinta dos Lombos podia ser um “trampolim” para um clube ainda maior?
AM: Acho que foi mais um passo, até porque quando me mudo tinha também a hipótese de ir para o Sporting CP. Fui eu que preferi ir para o Quinta dos Lombos, porque achei que se enquadrava mais no padrão do que precisava naquele momento. E correspondeu a 100%, porque conseguimos ser competitivas, crescer e estar mais no meu patamar competitivo daquela altura.
Acho que foi uma decisão certa e não pensando muito a longo prazo, até porque não sabia o que ia acontecer e via o Quinta dos Lombos – como ainda vejo – como um histórico do Futsal Feminino. Sabíamos que tinha uma boa formação, bons dirigentes e realmente importadas com o Futsal Feminino e sabia que, nesse aspeto, ia estar muito bem.
AFCB: Ficas no clube durante quatro temporadas e, na última, tens um grande desempenho individual, com 17 jogos e 25 golos. Sentiste que era o momento de dar o salto?
AM: Foi uma temporada muito boa a nível individual, porque fui sentindo muitas coisas ao longo dessa época e tive de gerir várias emoções. O Canal 11 aparece nesta altura, tínhamos muito mais destaque, apesar de não estar num “grande”. Havia muitos convites para entrevistas, a importância dos golos e tudo mais. Sempre me tentei desviar um pouco disso, porque queríamos levar o clube onde nunca tinha chegado. A verdade é que, a meio da temporada, tinha o treinador do SL Benfica a ligar-me e tive que gerir toda essa parte, porque o meu foco era o sucesso da equipa.
De qualquer forma, não posso mentir que, no final dessa temporada, tal como aconteceu quando sai da UD Cariense e dos Restauradores, senti que estava preparada para mais uma nova experiência e um novo patamar. Senti que foi tudo gradual e, no fim dessa temporada, por muito feliz que estivesse, queria experimentar uma coisa diferente.